terça-feira, 20 de abril de 2010

Terry Gillian em 2 filmes



Por incrível que pareça,Terry Gillian é lembrado por ser um diretor extremamente azarado.Tempestades e ventanias costumam destruir seus cenários,seus protagonistas desistem da produção ou morrem misteriosamente.Tudo parece conspirar contra suas produções,as quais ele batalha para financiar e distribuir,pois todos em Hollywood sabem que ele e seus filmes não costumam chamar muito público.E se as platéias não ajudam,boa parte da crítica não abre os olhos para as suas obras.Gilliam é assim,deixado de lado por ser um criador ousado e inventivo,mas que ao mesmo tempo precisa de dinheiro e visibilidade para poder dar vida as suas criações.

A fantasia,o sonho,o surreal.Ele criou um gênero,mas ninguém ainda arriscou ser influenciado.Sempre quando se assiste a um filme seu,deve-se ter consciência de que qualquer traço de realidade vai ser extinto com o decorrer da trama.Na primeira cena,tudo parece fazer sentido,personagens e histórias parecem que irão seguir o curso habitual de qualquer outra película "normal".Mas aos poucos,Gilliam vai destruindo todas esses suposições,toda a realidade,colocando em cena suas explosões criativas,nostálgicas e surreais.

THE ADVENTURES OS BARON MUNCHAUSEN
AS AVENTURAS DO BARÃO MUNCHAUSEN(1988)
dirigido por Terry Gilliam
escrito por Charles McKeown e Terry Gilliam
estrelado por John Neville,Eric Idle e Sarah Polley

Baseado numa fábula infantil,O Barão de Munchausen é uma desafiadora afirmação de um gênero.Se tem uma palavra que possa representar todo o filme,essa palavra é loucura.Balões voadores de tecido,pianos de tortura humana,barões que voam em bolas de canhão... Porem,mais sem sentido do que o próprio filme é alguém querer ficar descrevendo e explicando tudo que acontece nele,e isso vale para praticamente tudo o que Gillian faz.

No início da trama ,tudo é tão coeso e previsível para os presunçosos.Estamos no século XVII,e a cidade de Londres está passando por uma terrível guerra.Uma decadente companhia de teatro encena a antiga fábula do Barão de Munchausen.Vivendo na miséria,os atores ainda correm o perigo de perder o teatro para o conselho fiscal.Num dia normal,no meio de uma das apresentações pitorescas do grupo,um estranho idoso interrompe o espetáculo,alegando ele ser o próprio Barão de Munchausen.Até aí,o filme repousa na confortável terra dos filmes coesos que não são dirigidos por Terry Gillian.Mas o misterioso velhinho resolve provar quem ele é,contando a platéia uma de suas aventuras.Pronto,a partir de agora o imaginário do diretor irá transportar o espectador para o mundo insano das fábulas de antigamente.

Munchausen constrói um balão gigante com as roupas de baixo de todas as mulheres da cidade,e voando nele vai recrutar seus antigos companheiros de batalha,para a grande missão de defender a cidade dos invasores.O mundo fantástico que Gillian elege como pano de fundo da obra é uma clara referência ao mundo do teatro do século XVII.Quando ao invés de filmes,as superproduções eram as peças com complexos cenários mecânicos.O diretor evoca os tempos em que participava como animador no seriado de T.V. "Monty Phyton and The Flying Circus",onde ele premiava o telespectador com vinhetas animadas compostas por recortes em stop-motion.Já era o começo da formação de um estilo,que ele deixa aflorar ao máximo em Barão de Munchausen.

nota:9,5


THE IMAGINARIUM OF DOCTOR PARNASSUS
O MUNDO IMAGINÁRIO DE DOUTOR PARNASSUS(2009)
dirigido por Terry Gillian
escrito por Charles McKeown e Terry Gilliam
estrelado por Crstopher Plummer,Lily Cole,Heat Ledger e Tom Waits

21 anos e algumas obras-primas depois,Terry Gillian volta ao mundo teatral,em um projeto ambicioso,original e mais uma vez,azarado."O Mundo Imaginário de Doutor Parnassus" ficou conhecido como "o último filme de Heath Ledger",e é só por isso mesmo que ele é lembrado pelo público e crítica.Todo o brilhantismo de mais uma viagem ao fantástico de Gillian é limitado pelo falecimento de um ator.Não que Ledger não fosse um ótimo ator ou não estivesse tão bem no filme.Na verdade,ele está excelente,mas não passa de um dos detalhes que compõem este instigante pesadelo do diretor.Ambientado nos dias atuais,mesmo com personagens e trama aparentemente medievais.Esse delicioso anacronismo é a chave para a mais uma viagem a literatura e ao teatro de tempos remotos

A trama segue uma companhia de teatro itinerante e decadente,liderada por um homem imortal chamado Parnassus(Cristopher Plummer,genial).O grupo possui no seu palco um espelho mágico,que permite que qualquer um que o adentre viva um mundo imaginário produzido pelo próprio visitante.Mas tudo isso é fruto de um antigo pacto com o diabo(Tom Waits ),que agora Parnassus terá de cumpri-lo entregando sua filha(Lily Cole) as mãos do capeta.Mas,tudo muda quando eles encontram Tony(Ledger,Law,Depp e Farrel),um empresário com amnésia e dívidas com a máfia russa.

Para compensar a inesperada morte de Ledger no meio das filmagens,Gillian optou por adaptar a trama de forma que outros atores possam viver o mesmo personagem.Cada "visita" ao espelho mágico de Parnassus é um ator diferente que encarna Tony,são eles :Jude Law,Collin Farrel e Johnny Deep.E mais uma vez Gillian consegue driblar perfeitamente as dificuldades que o destino coloca a frente de suas obras.

Louca e engenhosa,a trama não procura ficar apoiada na estética deslumbrante.Que contém direção de arte e figurinos esplêndidos,que acabaram rendendo indicações ao Oscar.O que distancia Parnassus de Barão de Munchausen é o uso de CGI nas cenas graficamente complexas.O que deixa os fãs de Gillian um pouco decepcionados,ja que o diretor aposenta parte dos efeitos artesanais devido a comodidade de se fazer tudo por computadores.

Mas nada tira o brilho de mais uma rejeitada e fantástica viagem "gillianesca". Parnassus é uma autêntica fantasia de raízes clássicas,que conta com personagens e cenas que não poderiam vir da mente de outra pessoa se não o rei da fantasia.

nota:9,0




ACONTECEU EM WOODSTOCK
TAKING WOODSTOCK(2009)

dirigido por Ang Lee
escrito por James Schamus
estrelado por Henry Goodman e Imelda Staunton

Como definir uma geração em um filme? Os anos 70 já tiveram o privilégio de serem muito bem representados em filmes como Hair(Milos Forman) e Easy Rider(Dennis Hopper),e agora,40 anos depois,retornam ao foco com Aconteceu em Woodstock.O ambicioso projeto de Ang Lee consiste em contar a história do maior festival de sexo,drogas e rock n' roll de todos os temos.Responsável por definir a contra-cultura daquele tempo e marcar ouvidos e neurônios de uma geração inteira,Woodstock talvez seja grande demais para caber em um filme.

Frustrado com sua carreira de designer,o jovem workaholic Elliot Tiber volta para a pequena comunidade agrícola onde nasceu,na tentativa de ajudar seus pais no decadente hotel da família.Precisando de dinheiro,surge a sua frente uma oportunidade irrecusável: Alugar os terrenos da região para a realização do que será o maior festival de rock do país,o Woodstock.Apesar de manter-se um sujeito sério e trabalhador,ele começa a notar a avalanche de revoluções liberais que a sua geração experimentava na época.

O roteiro,baseado numa história real,possui todas aquelas figuras que podemos imaginar que estariam em Woodstock.Personificações de velhos clichês,cada um levantando alguma bandeira,e alguns sem propósito nenhum na história.Assim,Aconteceu em Woodstock se transforma num filme de caricaturas,uma reunião de personagens e tramas estereotipados sobre os anos 70.

Todo esse clichê não deixa espaço para aquela intensidade e insanidade que qualquer obra sobre Woodstock pede.Tudo é muito leve e sóbrio,com subtramas sobre crises familiares e existenciais totalmente esquemáticas e inúteis,enquanto a lisergia daqueles tempos é deixada em segundo plano.E para piorar,a música é completamente ignorada.Onde estão Hendrix,Joplin,Baez e cia.?

Se na parte dramatúrgica o filme passa longe dos anos 70,esteticamente ele é extremamente bem sucedido.Os maneirismos que Ang Lee emprega em algumas cenas,como a tela dividida,funcionam muito bem.Porém,a maior atração de todo o filme é a fotografia de Eric Gautier,fotógrafo francês que mescla o colorido com o granulado,compondo imagens genuinamente setentistas.

Ang Lee possui uma filmografia digna de respeito.Na qual os pontos altos são os filmes de maior sensibilidade como A Chuva de Gelo.Quando ele tenta fugir desse padrão,buscando se reinventar,ele fracassa.Flertou com o cinema de ação em 2003 com Hulk,e criou uma verdadeira abominação.Aconteceu em Woodstock parece um filme de hippies dirigido por um Ang Lee caretão, inseguro com o que tem nas mãos.

nota:5,0

sábado, 17 de abril de 2010

A França em 2 Filmes

DANTON(1983)
dirigido por Andrzej Wajda
escrito por Jean-Claude Carriére e Jacek Gasiorowski
estrelado por Gerard Depardieu e Wojciech Pszoniak

Como uma das uma principais figuras da fase inicial da Revolução Francesa,Georges Jacques Danton tem sua importância para a história da França inegável.Coube ao polonês Andrzej Wajda tornar a vida do revolucionário uma obra de mesma relevância ao cinema.Escrito por um dos mais geniais roteiristas do cinema,Jean-Claude Carriére, e estrelado pelo maior ator francês,Gerard Depardieu,o filme busca uma representação minimalista de uma das maiores mudanças de rumo da história mundial.

O ano é 1793.Com a revolução já instaurada,o embate ideológico entre nobreza e burguesia foi deixado de lado,enquanto rixas entre membros de mesmo partido tomavam conta do cenário político francês.Os jacobinos,partido composto pela baixa burguesia radical,ascendem ao poder liderados por Robespierre,conhecido por sua tirania e impopularidade.Inicia-se uma nova fase da revolução,a chamada "Terror".

Opositores ao governo era sumariamente perseguidos e guilhotinados pela cúpula governamental.Danton,membro do mesmo partido,contestava o autoritarismo vigente e ainda contava com o apoio opinião pública.Com ousadia e perspicácia,ele trava um longo embate com Robespierre,que agora teme a fúria do povo.

Com grandes atuações e um grande texto,Danton é uma realização formal e certeira.Wajda,na ativa até hoje, expressa todo o talento que o fez ser reconhecido como um dos principais diretores europeus.Sempre teve preferência por filmes históricos e verossímeis,com reconstituições perfeitas de cenários e figurinos.Aliado ao roteiro de Carriére,surgem algumas cenas antológicas,como os debates na Convenção jacobina e as decapitações na guilhotina.

Mesmo lembrando suas qualidades,é impossível ignorar os vícios de Wajda.Danton é também um filme frio,que pouco cativa o espectador.Dramaticamente,ele está todo concentrado em longos debates de linguagem rebuscada,que muitas vezes só fazem sentido para quem estuda a Revolução Francesa.

Mesmo assim,Danton é até hoje o melhor filme sobre este tão importante capítulo da história da França.

nota:8,0


GERMINAL(1993)
dirigido por Claude Berri
escrito por Arlette Langmann e Claude Berri
estrelado por Gerard Depardieu e Miou-Miou

País-modelo das leis trabalhistas,a França deve isso aos grevistas que invadiam suas ruas meados do século XIX,movidos pela fome tanto de comida quanto de justiça.Emile Zolá baseou-se na história desses trabalhadores para escrever um dos maiores romances do país,Germinal.Décadas depois,o livro é trazido ao cinema por Claude Berri,lendário diretor patriota que assume a responsabilidade de manter toda a epicidade e grandeza da obra original.

Desde o início,o filme nos da uma sensação de imersão.Os ambientes hostis e insalubres onde se desenrola a trama,são reproduzidos de forma magnífica por uma composição técnica irrepreensível.Todas as cenas em que os trabalhadores entram nas assombrosas minas subterrâneas,poderiam muito bem compor uma antologia das melhores cenas já produzidas pelo cinema francês.

A história tem como ponto de partida o encontro da família de Depardieu com um homem errante em busca de trabalho.Ao juntar-se a massa mineradora da região,o homem assume o posto de líder revolucionário dos trabalhadores,esfomeados e indignados com a postura de seus chefes.Com um panfletarismo moderado,o filme retrata as novas ideologias reacionárias que surgiam naquele momento,como o marxismo e o anarquismo.

A fidelidade quase absoluta que Berri tem com a obra original de Zolá tem pontos positivos e negativos.Germinal acerta em manter a atmosfera e a ambientação do livro,mas erra ao não se desprender da trama novelesca do mesmo.O roteiro e suas reviravoltas lembram unicamente um romance clássico,ignorando as adaptações necessárias que o cinema exige.

Berri sempre foi conhecido por comandar grandes produções.Germinal é até hoje um dos filmes mais caros já feitos a França,assim como faturou alto nas bilheterias da época.Objeto de estudo e admiração,Germinal não é uma obra perfeita,mas mantém-se como um dos mais cultuados filmes franceses.

nota:9,0

sábado, 10 de abril de 2010

EDIFÍCIO MASTER(2002)
dirigido por Eduardo Coutinho

Aquela máxima criada por Glauber Rocha:"Uma câmera na mão e uma idéia na cabeça",ao meu ver sempre fica melhor aplicada a documentários.Basta algum conteúdo,uma boa idéia,para filmar a realidade que está diante das câmeras.Muitas vezes essa idéia pode ser incitada por um local,um lugar onde desperta o senso criativo do cineasta.Um edifício velho e populoso é um desses locais.

"Edifício Master" é uma realização de Eduardo Coutinho,um dos principais documentaristas brasileiros.Como toda sua filmografia,seus documentários caracterizam-se pela simplicidade.Coutinho prefere filmes secos,sem efeitos,trabalhando com poucos recursos e nenhum apelo comercial.Ele e sua equipe alugaram por três semanas um pequeno apartamento no tradicional Edifício Master,localizado em Copacabana.São em média 500 moradores de classe média-baixa,cada um vivendo sua vida em meio aos numerosos vizinhos.

A proposta de Coutinho é gentilmente visitar alguns apartamentos e aos poucos ir entrando no íntimo de cada condômino que cede uma entrevista.Ele e sua equipe marcam um encontro com cada entrevistado,e ao adentrar o espaço de cada um,são surpreendidos por relatos comuns sobre pessoas comuns,mas que emocionam e cativam o espectador de forma imbatível.

A figuras que surgem na tela são impagáveis.A maioria idosos,tão antigos quanto as paredes de seus apartamentos.Um deles morou nos Estados Unidos a vida inteira,possui três filhos lá,enquanto mora completamente sozinho no Rio de Janeiro.Diante das câmeras ele relembra o dia em que Frank Sinatra o convidou para subir no palco e cantar "My Way",proporcionando um dos momentos mais emocionantes do filme.Algumas figuras também causam certa estranheza,como uma jovem reclusa que passa toda a entrevista sem olhar para o entrevistador,revelando todos os seus distúrbios e neuroses.Já outras são quebradoras de paradigmas,como a mãe prostituta que não esconde de ninguém seu ofício.

Um dos maiores méritos do documentário é a forma na qual Coutinho aborda seu "elenco".Ele mesmo faz as perguntas,sempre simples e inofensivas,quem revela tudo são os entrevistados que não escondem os sorrisos e lágrimas visivelmente sinceros.Em muitos documentários que vejo,os produtores fazem de tudo para as "vítimas" do filme chorarem,fazendo perguntas capciosas e praticamente descascando cebola para alcançar esse objetivo.Em Edifício Master tudo é muito natural,uma valiosa fuga do sensacionalismo.

Concebido de forma corajosa e original,"Edifício Master" é um dos principais filmes brasileiros da retomada.Muitos podem sentir falta de um trabalho de edição mais elaborado,mas isso é justamente o que o diretor tenta evitar durante toda sua carreira.Coutinho quer impressionar pelo que as câmeras capturam,não pelo que o computador gera.E por isso que não devemos deixar de assistir tudo o que ele filma.

nota:9,0

domingo, 21 de março de 2010

DAS WEISSE BAND - A FITA BRANCA(2009)
escrito e dirigido por Michael Haneke
estrelado por Christian Fendel


Haneke é um dos mais(se não 'o' mais) respeitado,discutido,amado e odiado diretor europeu da atualidade.Após se tornar internacionalmente conhecido em 1997 com "Funny Games",seus filmes foram a mira de diversas declarações de amor como também torrentes de alteradas manifestações de ódio.Tal controvérsia parece causar prazer ou indiferença no senhor de 68 anos,que continua a incitá-la com seus filmes ou com bizarras decisões artísticas,como a de refilmar quadro-a-quadro "Funny Games",em Hollywood e com atores americanos.
Haneke eleva a produção cinematográfica a um patamar que transforma críticas em carvão que alimenta a sua chama criativa.E é devido a isso que é difícil esperar dele uma obra menor que "A Fita Branca".

A história,escrita pelo próprio diretor,conta história de um pequeno e longínquo vilarejo alemão em plena 1ª Guerra.Representando a configuração social do país na época,o lugar é regido por um Barão,seguido pelo núcleo religioso,e o resto da população composto por típicas famílias camponesas.A partir de um acidente tramado que quase mata o médico local,estranhos atentados decorrem sem motivos aparentes,aturdindo a vida regrada e sofrida do povo.



"Uma das invenções da fotografia é a constatação de que o preto e branco torna mais fácil e ágil o acesso ao passado, uma vez que ele cria uma fratura na observação do real"
Haneke

Descendente de italianos,eu já fui diversas vezes apresentado a fotografias preto e branco amareladas,retratando as antigas colônias onde meus antepassados viviam.Assistindo ao filme de Haneke,e trocando a Itália por costumes e tradições germânicas,acabo tendo um inesperado reencontro com aqueles retratos.
Antes de tudo,"A Fita Branca" é a história em movimento.Haneke deixa claro essa intenção na narração em off que pontua os capítulos do filme.Feita por um simpático idoso que participa da história em sua versão jovem,o recurso aproxima o filme a um conto feito por avós,orgulhosos e ansiosos em contar suas vivências aos mais novos.


"Uma vez que uma pessoa constrói para si um princípio absoluto, ela, pouco a pouco, perde a sua humanidade, encaminhando-se para a prática do terror."
Haneke

Sufocadas pelo conservadorismo religioso,as crianças do filme vivem uma vida quase livre de afeto, estagnada pelos preconceitos culturais,étnicos e raciais.Dessa aparente inocência severamente moldada,nasceria mais tarde uma sociedade que envergonharia a humanidade,aquela que elegeu o nazismo como ideologia.
Psiquiatras apontam os traumas de infância como geradores de adultos perversos e perturbados.Imaginem toda uma geração de crianças vivendo um trauma coletivo,filhos de pais que escolheram o castigo e a distância emocional como uma forma de criar cidadãos "úteis" a sociedade.
Para lembrar-los dos valores pueris que uma criança deve respeitar,é amarrado no braço dos encrenqueiros a tal fita branca do título.O castigo simbólico lembra também todos os valores arcaicos de uma sociedade tradicionalista,como a submissão feminina,pregada e praticada pelos adultos do vila.
Apesar de tudo,as crianças ainda são o maior bem de todos,bem como são o centro do filme de Haneke.Os pais sempre buscam proteger seus filhos de qualquer acusação,julgando ter total controle de sua prole.Embora isso não impeça que tanto o narrador quanto o espectador desconfiem da inocência dos pequenos,que de uma forma ou outra parecem interferir nos estranhos acontecimentos da vila.


"A Alemanha que encontramos às vésperas de 1914 não me parece ser um paraíso perdido, que viria a ser maculado pelo nazismo. A barbárie e a perda da humanidade já faziam parte daquele mundo."
Haneke

Desde o primeiro frame,A Fita Branca é uma obra melancólica.Como disse Haneke,a depreciação humana era constante nas relações de todos na vila.A morte sempre parece estar por perto,e isso é explícito em cada diálogo.O mesmo pode ser sentido em obras-primas do já citado Ingmar Bergman,como "Gritos e Sussurros" e "Luz de Inverno",onde o medo da morte é o agente causador das mudanças comportamentais.
Mas nada disso impede que Haneke adicione a trama uma breve história de amor,entre o personagem-narrador e uma recatada serviçal do barão.Traçando um retrato da ingenuidade dos casais da época,repletos de amor contido e medo dos olhares alheios.



"Costumo dar muito trabalho aos fotógrafos, inventando o máximo que posso no set, não apenas nos enquadramentos da câmera, mas também na iluminação. Já tenho suficiente experiência no cinema para saber se uma lâmpada vai produzir o efeito que eu pretendo alcançar ou não."
Haneke

O uso da luz nas telas pintadas sempre movimentou o mercado de arte.Como fez o holandês Johannes Vermeer,que costumava utilizar uma câmara escura para visualizar os temas que iria representar em sua telas.Pegar emprestado a beleza de telas pintadas para compor a fotografia de um filme já é um recurso bastante utilizado.Em "A Fita Branca",a magnificência estética é tamanha,que cada frame poderia ser uma tela,cada qual com sua beleza particular.Resultado de um trabalho intenso de Haneke com o Christian Berger,que já faturou o prêmio do American Society of Cinematographers como melhor fotografia do ano.

Para estar no elenco de um filme de Haneke é necessário ter muito talento,coisa que ele mesmo nunca escondeu.Para "A Fita Branca" houve a necessidade de uma extensa busca por um elenco infantil,feita por toda a Alemanha.O resultado mais uma vez é invejável,com a descoberta de atores como Leonard Proxauf,que interpreta o encrenqueiro Martin,responsável pelos melhores momentos do filme.

Como já está explícito nos comentários em itálico dele próprio,Michael Haneke é um diretor que tem pleno controle de sua obra,desde o argumento até os aspectos técnicos,ele sabe o que faz.

"A Fita Branca" é uma lúdica passagem ao passado,uma experiência daquelas que só o cinema,na imponência de sua composição,pode proporcionar.

*citações da entrevista de Haneke ao "Blog do Bonequinho"
nota:10



UN PROPHÉTE (2009)
dirigido por Jacques Audiard
escrito por Thomas Bidegain e Jacques Audiard
estrelado por Tahar Rahim e Niels Arestrup

Nem todo filme precisa revolucionar um gênero para ser memorável.Muitas vezes,basta apenas alguma originalidade aliada a boa técnica.Jaques Audriard,diretor francês pouco conhecido,faz exatamente isso."Un Prophéte" é um filme de cadeia,daqueles tradicionais,com direito a linchamentos,selvageria,gírias e sexo oral forçado.Mas a competência de Audriard ilumina o que seria um retrato convencional,e o transforma numa experiência impactante e intimista,prendendo o espectador a uma firme corrente carcerária.

Un Prophéte conta a história de Malik,um jovem árabe recém chegado a uma prisão francesa.Sem ter em quem confiar,ele se depara com a cadeia cheia de seus conterrâneos árabes,e uma perigosa gangue de córsegos que praticamente domina e controla todos os detentos.Malik é escolhido pelo ranzinza chefe da gangue para fazer um pequeno serviço: Matar o detento vizinho de cela que o oferece drogas em troca de sexo oral.Sujando suas mãos de sangue,o jovem de 19 anos começa a adentrar no mundo das "grandes raposas" do crime,subindo aos poucos na hierarquia do violento e incerto mundo do narcotráfico.

Naturalmente,começam a pipocar diversas comparações a outros "filmes de cadeia".Como Carandiru e Um Sonho de Liberdade.Um profeta está em uma esfera totalmente diferente,tratando do universo carcerário de uma maneira bem particular.Carandiru possuía toda aquela malícia e precariedade comum as prisões brasileiras,com uma trama de proporções maiores e mais complexas.Já Um Sonho de Liberdade,que conta com uma trama leve e romântica,é o extremo oposto de Um Profeta.

O filme de Audiard é uma retrato verossímil,com uma trama perfeitamente possível e assustadora.A realidade da prisão é vista pelos olhos de um rapaz recém-saído da adolescência,onde passou traficando e consumindo drogas.Contrariando a imagem da França como nação modelo no quesito educação,Malik é um analfabeto,e suas raízes árabes ainda denunciam o palpitante xenofobismo do país.

Assim,o filme abre espaço para diversas discussões,cutucando nas feridas de seu país de origem.Isso é feito sem deixar de lado a trama,cheia de reviravoltas e personagens bizarros já tradicionais numa cadeia.O roteiro,da autoria do próprio diretor,é excelente.Retrata com perfeição as mudanças de comportamento do protagonista,que começa o filme como um jovem assustado,e com o decorrer da trama se transforma num criminoso seguro de suas ações e de seu perigo.Tal aprofundamento psicológico e feito com grande sensibilidade,não limitando-se apenas na ação física.

A caracterização perfeita do personagem principal é também fruto da atuação soberba do ator Tahar Rahim,que encarna todas as cicatrizes e caras feias de um detento.Todo o resto do elenco,composto por atores praticamente anônimos,se saí muito bem.A atenção especial de Audiard com a atuação é notável,assim como em praticamente todos os aspectos técnicos.

Un Prophéte não criou uma nova maneira de se retratar cadeias no cinema.Ele reinventou esse subgênero na França marginal contemporânea,e com exímio talento de seu diretor,conseguiu chegar as principais premiações mundo afora,como também deu uma sacudida no apagado cinema francês.

nota:8,2

sábado, 13 de março de 2010

AMOR SEM ESCALAS - UP IN THE AIR(2009)
dirigido por Jason Reitman
escrito por Sheldon Turner e Jason Reitman
estrelado por George Clooney e Vera Farmiga

O cinema hollywoodyano é o mais bem sucedido e conhecido cinema do mundo.Assim como é reconhecido como sendo a mais pura fantasia,distante e isolada da realidade.Por isso,quando alguma notícia do cotidiano possui alguma reviravolta(as) mirabolante,ou quando tudo parece dar certo no final,empregamos o bordão "parece cena de cinema" ou "uma história de filme".Tudo isso é fruto da repetição das fórmulas hollywoodyanas.O cinema mainstream americano cravou algumas regras básicas para a soluções de tramas,e o seu sucesso acabou viciando o público e impondo tais regras a qualquer outro cineasta que queira ver seu filme bem aceito.TUDO tem que dar certo,é isso que o grande público quer ver.Felizmente não é isso que "Amor Sem Escalas" tem a oferecer.

Ryan Bingham é uma espécie de eremira-nômade moderno.Trabalha para uma empresa cuja única função é demitir funcionários de empresas que não querem assumir o difícil compromisso.Tal ofício o faz ser um eterno viajante,sua vida é resumida entre aeroportos e hotéis,e o pouco tempo que passa na sua "casa",ele odeia.Bingham cria e adota uma filosofia de vida incomum,que consiste na dispensa de todos os seus bens materiais,seus familiares e amigos,considerando-os mera bagagem.Até que um dia,uma novata do ramo das demissões apresenta um sistema que permite demitir funcionários via internet,o que ameaça o futuro de Bingham ,que ainda terá de conviver com o amor e o passado que constantemente o atormentam.

O roteiro concilia múltiplas contradições na vida de apenas um personagem.Bingham recusa-se a assumir qualquer compromisso,embora esteja constantemente apaixonado.Ao mesmo tempo que ele ama seu trabalho,ele sente pena de cada desempregado que deixa por onde passa.Embora sinta-se em casa quando está em aeroportos ou hotéis,ele não suporta a falsa hospitalidade desses ambientes.São estes e outros conflitos internos que Bingham busca esconder durante todo filme,como uma forma de provar sua aparente felicidade.

A comédia e o romance estão presentes,mas acima de tudo está a melancolia.O roteiro trata de um assunto atual,o desemprego na recente recessão americana,e ainda retrata com muita propriedade a solidão de seu protagonista,parecido com tantos engravatados que andam por ai.Essa injeção de realidade faz com que a distância entre o espectador e a trama diminua,tornando-o um filme intimista.

Mas nada tende a eclipsar o grande brilho do filme.George Clooney? Não,os diálogos.Up In The Air possuí uma maturidade muito maior do que a maioria dos filmes atuais,e os diálogos são a grande prova disso.Não li o livro no qual os roteiristas,Reitman e Sheldon Turner,se basearam,mas com certeza eles compõem diálogos tão inteligentes e perfeitos que parecem ser extraídos de uma coletânea de citações.São conversas que extraem de maneira intuitiva,o máximo de cada personagem,sem apelar para o humor ou sentimentalismo barato.

Up In The Air é regido por uma das maiores promessas de Hollywood,Jason Reitman.Ele é filho do diretor de os Caça-Fantasmas,Ivan Reitman,responsável também por uma série de comédias medíocres que você provavelmente viu na Sessão da Tarde,como Junior(Arnold e seu irmãozinho DeVito).Esquecendo o parentesco,Jason está no terceiro longa de sua filmografia.Estreou com o genial e subestimado "Obrigado Por Fumar",que até possuía um protagonista semelhante a Ryan Binghan.E logo depois lançou Juno,filme que mais parecia uma campanha pró-adoção ou anti-aborto,e que acabou se tornando um fenômeno de crítica e bilheteria.Com Amor Sem Escalas,Reitman prova que não mais pode ser chamado de promessa,e sim uma realidade,ele é realmente talentoso.

Muitos discordam quando George Clooney é visto como mais que um galã,um bom ator.Como disse Rubens na transmissão do Oscar "Clooney é um ator o moda antiga".E realmente,ele lembra tanto no sorriso quanto na atuação,os astros dos anos cinquenta,como Cary Grant ou Gregor Peck.Clooney mostra que não é preciso chorar e se descabelar para interpretar um personagem melancólico como Ryan Binghan,ele atua de forma sublime e natural,exatamente como manda o personagem,que parece ter sido escrito para ele.

Além de Geroge,todo o elenco funciona de maneira perfeita,o que ajuda acentuar os já excelentes diálogos.A quase desconhecida Vera Farmiga,empresta seu charme(e um pouco mais) a personagem que rouba o coração de Clooney.Completado a dupla feminina,a jovem Anna Kendrick rouba a cena em todas que aparece,interpretando uma moça séria e compenetrada com sua expressão meiga e doce.

Enfim,Reitman é um diretor ainda de pouca experiência,mas com talento suficiente para fazer tudo funcionar dentro de um filme.Amor Sem Escalas é uma obra nitidamente diferenciada,é ele e outros filmes eventuais,que fazem o cinema americano valer a pena.

nota:9,0

quarta-feira, 10 de março de 2010

Oscar 2010

Uma noite feliz para o cinema.

Estou confuso.Sempre concordei com aqueles que afirmam que a Academia sempre olha para os indicados com um olhar político e comercial,raramente escolhendo os "melhores do ano".Em praticamente todos os anos que acompanhei a cerimônia,essa teoria foi exaustivamente provada.

2010.Ano em que o cinema avança milhas na área da tecnologia.Surgem efeitos visuais revolucionários,as exibições em 3D são expandidas por todo mundo... E o filme que representa e produz tudo isso é Avatar.Uma obra de uma beleza plástica única,mas de raso conteúdo.Ao mesmo tempo que representa um grande conjunto de inovações técnicas,demonstra uma triste regressão no aspecto dramático.

Graças a uma porcentagem de indivíduos que enxergaram estes e outros defeitos gritantes,sobrou espaço para um filme de raso orçamento,mas de farto conteúdo.Guerra Ao Terror só chegou onde chegou pela sua qualidade.Não por bilheterias altas e marketing mundial,e sim pela promoção boca-a-boca.Contando com a força da opinião dos críticos,o filme foi somando admiradores e prêmios mundo afora.E o resultado está aí,6 oscars,merecidos como poucos outros filmes mereceram.














Quando a cerimônia,devo admitir que foi um pouco menos tediosa do que costuma ser.O humor foi mais acionado,e a dupla de apresentadores foi muito bem.Steve Martin e Alec Baldwin não se limitaram a aquelas piadinhas insossas e respeitosas,eles fizeram o que sabem fazer mesmo.

















Tirando a meia dúzia de estatuetas para Guerra Ao Terror,poucas surpresas completaram a noite.Uma delas foi o prêmio de melhor roteiro para Precious,um filme ruim que acabou com mais estatuetas que Bastardos Inglórios,delírio Tarantinesco que merecia muito mais,mas que ficou com o merecido prêmio de Melhor Coadjuvante para o fabuloso Cristopher Waltz.

















A obra-prima Up teve sua genialidade comprovada,ganhando dois prêmios.O de melhor animação e melhor trilha sonora para Michael Giaccino.Nos filmes estrangeiros,uma surpresa,o argentino O Segredo de Teus Olhos faturou a estatueta,indo contra todos que esperavam o mestre Michel Haneke subir no palco pelo aclamado A Fita Branca


















Não gostei da decisão de cortarem o Oscar Honorário,mas pelo menos não deixaram de fora as homenagens aos que se foram.Um dos melhores momentos da noite foi a homenagem a John Hughes,diretor falecido ano passado.Ele é responsável por formar a cultura oitentista nos cinemas da época.Subiram no palco os principais astros de filmes como Uma Garota Nota 1000,A Garota Rosa Shocking e Curtindo a Vida Adoidado.





Ben Stiller: "O que acharam da minha fantasia? Era isso ou um oficial nazista."


TOP 10 DOS INDICADOS A MELHOR FILME
(pela minha preferência)

1.
Guerra Ao Terror (6 estatuetas)
2.Up (2 estatuetas)
3.Um Homem Sério
(nenhuma)
4.Amor Sem Escalas (nenhuma)
5.Bastardos Inglórios (1 estatueta)
6.Educação (nenhuma)
7.Distrito 9 (nenhuma)
8.Avatar (3 estatuetas)
9.Um Sonho Possível (1 estatueta)
10.Preciosa (2 estatuetas)

quinta-feira, 4 de março de 2010

AVATAR(2009)
escrito e dirigido:James Cameron
elenco:Sam Worthington,Zöe Saldana,Sigourney Weaver


Com Avatar,James Cameron prova que sua megalomania não da espaço para fracassos na sua vida como empreendedor.Porque como diretor de cinema,é óbvio que o mesmo não se aplica.Desde que despontou no cinema com o clássico Tela Quente "Exterminador do Futuro",Cameron foi construindo uma carreira baseada em bons negócios,investimentos prolíficos que o fizeram se auto-proclamar "o rei do mundo".É por estes e outros motivos que ele tem lugar cativo no hall dos grandes empreendedores,como Steve Jobs,Bill Gates etc.

Avatar pode ser uma das provas de que imagens valem mais que palavras.Em meio a tanta beleza visual,escondem-se as palavras,o péssimo roteiro.Ver o filme em 3D no cinema ainda pode ser um dos melhores programas do ano.Basta esquecer toda a parafernália tecnológica por trás de tudo,e você será rapidamente absorvido pelas imagens deslumbrantes,que combinadas com a tecnologia 3D se tornam uma experiência divertida e única.

Foram dez anos desde o último lançamento de Cameron,Titanic.Nesse tempo,o "rei" e seus súditos forçaram ao limite todo o tipo de tecnologia em efeitos visuais.Alcançaram a perfeição na técnica de captura de movimentos,que consiste em utilizar movimentos e expressões reais do ator para a criação de um semelhante virtual.No total,foram estimadamente meio bilhões de dólares gastos para as ambições do rei.Enfim,Cameron passou uma década pensando em cada detalhe,esqueceu apenas de uma boa trama e um roteiro decente para sua criação.

Jake Sully é um ex-combatente que ficou paraplégico durante uma guerra terrestre.Ele é convidado a substituir seu irmão num missão chamada Avatar,onde é criada uma réplica sua em forma de um Na´vi,alienígena azul que habita uma lua distante chamada Pandora.Enquanto seu corpo hiberna na base do exército,sua versão alien corre livre pelos campos pandorianos.Pode parecer piada,mas o mesmo acontece com o avô dos pequenos espiões em "Pequenos Espiões 3".

Como já era esperado,Sully apaixona-se por uma Na-vi e se torna parte da estranha tribo.Estranha nem tanto.Os índios azuis são meras adaptações dos índios terrestres,com costumes e modo de vida muito próximos das tribos africanas.Basta adicionar as florestas luminescentes,as aves de montaria e a fisionomia grande e azulada dos Na´vi.

Cameron então coloca os terráqueos para incendiar os azulzinhos,que possuem em sua tribo um valioso minério cobiçado pelo planeta capitalista.A partir daí começam a surgir as 'mensagens' anti-belicistas e ecológicas,a fim de acrescentar uma falsa profundidade a trama.Mas nada disso faz Avatar fugir de um inevitável julgamento: ele é um filme pouco criativo. Reunindo idéias já testadas por blockbusters do passado,tudo o que Cameron faz é justificar os efeitos especiais,de uma forma que faça com que as pessoas não parem de ir ao cinema.

Na busca por essa trama acessível e simplificada para o prazer do grande público,o filme cai em outra perigosa armadilha: a infantilização.Tudo é inocente,pueril e incrivelmente infantil.Inclui diálogos do tipo:"Eles esmagaram sua cabeça feito jujuba" e o velho maniqueísmo desse tipo de filme,como aquele clássico combate entre o mocinho heróico e espirituoso contra o vilão sem escrúpulos com um corte no rosto.

Estaria errado se dissesse que Avatar é um filme insignificante,assim como estaria errado se dissesse que se trata de um bom filme.Verdadeiras revoluções no cinema aconteceram com obras que marcaram pela sua totalidade,incluindo suas inovações técnicas.Como aconteceu com a obra máxima e eterna 2001,la nos longínquos anos sessenta.

James Cameron abriu portas para que diretores mais competentes pudessem realizar obras melhores com toda a tecnologia que ele acaba de lançar.Por esse sentido,o filme tem sua importância comprovada.Avatar ainda fez o favor de adicionar um gás a indústria cinematográfica,fazendo girar mais dinheiro e projetos ambiciosos.Cameron merece aplausos sim,mas criatura azul por criatura azul,ainda prefiro os Smurfs.

nota:5,5

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

THE HURT LOCKER - GUERRA AO TERROR(2008)
diretor:Kathryn Bigelow
roteiro:Mark Boal
elenco:Jeremy Renner,Anthoni Mackie


Não é fácil definir a guerra em um filme.Por isso,cada obra do gênero possui seu olhar sobre o conflito armado que retrata.Recentemente,o mestre Eastwood inovou ao contar os dois lados de uma mesma guerra partindo do ângulo de seus soldados(Cartas de Iwo Jima e Conquista da Honra).Spielberg e Oliver Stone gostam de transformar a guerra num espetáculo pirotécnico,onde é ressaltado o brio e a glória dos combatentes.(O Resgate do Soldado Ryan,Platoon).Kubrick gostava de mostrar os soldados aprisionados pelo quartel,traçando secos retratos sobre a vida nos campos de batalha(Nascido Para Matar,Glória Feita de Sangue).Já o indiscutível maior filme de guerra de todos os tempos,Apocalipse Now de Coppola,noticiava a presença de um inimigo invisível nos fronts,a loucura,"The madness". O combate armado é visto como um vício forte e letal,uma droga.Assim como é dito nos segundos iniciais de "Guerra Ao Terror",filme dirigido por Kathryn Bigelow com nove indicações ao Oscar e a certeza de que entrara para história.

Existem poucas obras dignas de menção sobre a guerra do Iraque.Alguns diretores famosos já se aventuraram no tema,ás vezes bem-sucedidos,como Ridley Scott em "Rede de Mentiras",outras vezes extremamente infelizes,como DePalma no amador "Redacted".Porém nenhum filme havia sagrado-se definitivo,e a guerra do Iraque ainda não tinha seu representante ideal no cinema.O motivo talvez fosse o receio de alguns em falar sobre um assunto ainda tão fresco,que ainda mancha a bandeira americana.Ninguém esperava que uma obra independente,sem ambições de mercado e dirigido por uma mulher,viria a ser o retrato final e definitivo da guerra no Iraque.

A trama segue os últimos dias de recrutamento de um esquadrão especializado em desarmar bombas nos campos inimigos.O foco se mantém sobre três soldados de características e objetivos distintos.Owen,Sanborn e James.Apesar de sua experiência,James é novo na equipe.Chamado para substituir um veterano recém-morto em atividade,ele causa desconfiança no grupo,apesar de sua inegável competência.São retratadas a convivência e as arriscadas missões do esquadrão,que em breve terão seu tão esperado descanso.Esperado para alguns,aqueles que não estão absortos pelo vício da guerra.

Assim como Coppola e Kubrick,Guerra ao Terror valoriza os aspectos psicológicos dos soldados.Os conflitos da trama são movidos pelos temperamentos adversos dos recrutas,que acabam sendo obrigados a encontrar a amizade num campo de batalha.Um dos mais belos questionamentos feitos no filme é: Como pessoas que se odeiam podem lutar pela mesma bandeira? A sensação de alienamento dos recrutas é retratada com igual sensibilidade,mostrando os soldados como jovens que simplesmente não sabem ao certo porque estão ali.Para aqueles que buscam tiroteio e explosões desenfreadas,se surpreenderão com os momentos tocantes e o constante uso de silêncios nas cenas.

Guerra ao Terror também não deixa de lado a as sequências de ação cativantes,com esplosões e bons efeitos especiais.Quando os recrutas se veêm em situações de vida ou morte,a tensão é elevada a quinta potência,e as cenas tornam a distração uma tarefa quase impossível.E mesmo com as explosões e tiroteios presentes,cada uma delas vem com uma razão,um motivo dramatúrgico,não apenas pirotecnia para enfeite.

Como é de praxe em todo filme que dá atenção maior aos aspectos psicológicos,as atuações são de uma importância crucial.E também nesse aspecto,Guerra Ao Terror surpreende,contando com um elenco que mescla protagonistas anônimos com coadjuvantes famosos.O principa destaque é Jeremy Renner,que aflora toda a arrogância e desobediência de seu personagem,James. Guy Pearce e Ralph Fiennes são os mais famosos,e ambos ironicamente duram não mais do que dez minutos vivos.

Antes,se perguntassem quem era Kathryn Bigelow,muitos diriam que ele era a ex-mulher de James Cameron,hoje ela se tornou a diretora de "Guerra Ao Terror".A senhora de 59 anos assume o filme com uma autoridade invejável,imprimindo um jeito de filmar e conduzir o filme diferenciado.Isso sem falar na experiência corajosa de rodar uma película independente em terras estrangeiras.Embora ainda tenha o ex-marido pela frente,Bigelow possui boas chances de ser a primeira mulher a ganhar um Oscar de melhor direção.

Um sopro de criatividade no cinema independente americano,o filme marca para sempre o cinema e o espectador.Guerra Ao Terror é o cinema e a guerra em suas formas mais puras e cruéis

nota:9,3

domingo, 21 de fevereiro de 2010

A SERIOUS MAN - UM HOMEM SÉRIO(2009)
direção e roteiro:Joel e Ethan Coen
elenco:Michael Stuhlbarg,Richard Kind,Fred Melamed

Até quando um homem pode suportar os infortúnios da vida de maneira centrada e correta? A partir de que ponto ele deixará de ser "Um Homem Sério"? Estas já são perguntas frequentes na filmografia dos irmãos Coen,não apenas no seu novo trabalho,cujo irônico título parece sintetizar tudo o que eles fizeram antes.Forçando ao máximo a paciência de seu protagonista,pregando peças no espectador a todo momento,ironizando a ilusão da família feliz,"Um Homem Sério" é a mais pura essência de Joel e Ethan Coen.

Desde as primeiras civilizações,dentro de uma família,a figura mais importante é o patriarca.Soberano nas decisões da casa,o pai comanda os rumos de seus consanguíneos.Larry Gopnik é um professor de física,casado e pai de dois filhos,vivendo na classe média dos anos 70.Contrariando o que se espera de sua posição,Gopnik vive como um mero coadjuvante na vida de sua família.Sua mulher o despacha de casa para casar com um viúvo sessentão que insiste num "divórcio ritualístico".E os infortúnios da vida parecem não ter mais fim.E quando nosso herói parece estar a beira da explosão,ele prefere buscar ajuda na religião que fundamenta sua família,o judaísmo.Ele está aprisionado pela sua passibilidade,é apenas um homem dócil totalmente incapaz de agir.E assim,indo ao encontro de rabinos e advogados,Gopnik se prepara para um futuro obscuro e incerto.

Larry é o retrato do que seria um homem perfeito para a sociedade.Incapaz de reagir a qualquer situação,conformando-se em ter um emprego estável e uma família "feliz",mesmo que todos vivam em total desarmonia e discórdia entre si.É o tipo de personagem preferido dos irmãos Coen,que fazem de "Um Homem Sério" seu filme mais autoral.Joel e Ethan cresceram nos anos 70,num subúrbio em Minneapolis,filhos de mãe e pai judeus.Desfrutando de certa liberdade criativa,os diretores ironizam os valores religiosos os quais foram submetidos na adolescência,fundindo o dogmatismo com toda a imoralidade e liberdade dos 70.E é aí que nasce uma das melhores cenas do filme,quando o filho de Gopnik atravessa o dia de seu "bar mitzvah" sob o efeito de alguns cigarrinhos de maconha,divididos secretamente com seu amigo de escola.

Uma das críticas mais frequentes vinda do público sobre os filmes dos Coen,é a resistências dos dois em aceitar apenas um gênero.Uma comédia dos irmãos,nunca é um filme para você cair da cadeira,pois além da fuga do humor fácil e burro,o drama e a reflexão são sempre acionados,por mais cômicas que as tramas pareçam ser."Um Homem Sério'' não quer mesmo ser levado sério a todo momento. Um exemplo é a incompreensível abertura do filme.Mudando o formado da tela, é contada uma bizarra história de terror,sobre um falecido que visita uma família judia na era medieval.Logo após a parábola,os créditos e a música sugerem que veremos pela frente um filme de suspense sobre fantasmas judeus e antigas maldições,mas logo entra em cena o filme descrito na sinopse.

Tecnicamente irrepreensível,"Um Homem Sério" conta com excelentes atuações.A começar pelo protagonista,Michael Stulhbarg que representa a fragilidade e passividade em pessoa.Por motivos não conhecidos,Stulhbarg não foi indicado ao Oscar deste ano.A fotografia elegante é feita pelo veterano Roger Deakins,antigo colaborador dos Coen,e já indicado a 8 Oscar pelo seus brilhantes trabalhos.A trilha sonora é composta por um fina seleção de hits dos anos 70,que inclui a fantástica e esquecida banda Jefferson Airplane.

Para a surpresa de muitos,"Um Homem Sério" figura entre os dez indicados a melhor filme no Oscar 2010.Muitos podem considerar que só o nome dos irmãos na direção pôs "Um Homem Sério" na lista de indicados.Ledo engano.O filme é a reunião dos elementos essenciais do cinema dos diretores:humor negro,final aberto,personagens peculiares... Um híbrido entre o drama sólido de "Fargo" e a comédia obscura de "Queime Depois de Ler".Por tudo isso e mais um pouco,é uma grande felicidade ver "Um Homem Sério" na lista de indicados,mesmo que as chances de ver o filme levar o prêmio sejam zero.

Para muitos,pode até parecer exagero,mas acredito que "Um Homem Sério" tem todo o direito de figurar entre as cinco melhores realizações de Joel e Ethan Coen.Autoral,ousado,criativo,engraçado,comovente e acima de tudo,sincero.Uma obra candidata a cravar sua bandeira no restrito território de filmes cults,que chamam a atenção não por outra coisa a não ser por serem únicos.Aceite o mistério.

nota:9,0

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

INVICTUS(2009)
diretor:Clint Eastwood
roteiro:Anthony Peckham
elenco:Morgam Freeman,Matt Damon


Mais uma vez,Clint Eastwood! Com seus já avançados setenta anos de idade continua sendo um dos diretores mais 'trabalhadores' do cinema atual.Agora,será que os filmes que o velhinho lança quase que anualmente são realmente bons? Com "Gran Torino", Eastwood relembrou seus diais de Dirty Harry num marcante drama sobre racismo,em seu lançamento mais recente,ele investe mais uma vez no tema,agora em proporções globais."Invictus" conta a chegada de Nelson Mandela no poder da África do Sul,o fim do apartheid e o renascimento de um time de rugbi.

É difícil fazer um filme sobre Nelson Mandela e fugir de alguns clichês pentelhos,como discursos sobre paz e igualdade,personagens caricatos e toda a pompa dos filmes do tema.A versão diretor de Eastwood,aquela que passa milhas distante da sua versão ator,gosta de cinema sério,visando temas sociais bastante discutidos em congressos pela paz mundial.Invictus não foge de nada disso,mas as diversas qualidade técnicas e a competência de Eastwood acabam por contornar o cansaço da fórmula.

"Invictus" foca o período inicial da presidência do carismático líder negro,quando o país passava por tempos difíceis(passa até hoje) e toda população esperava de medidas imediatas para o combate aos emergentes problemas sociais do país.Mesmo arriscando sua popularidade,o presidente optou por incentivar e investir o principal time de rugbi da África do Sul,o Springboks,que em breve disputaria a copa do mundo.Além de ser um esporte jogado quase que unicamente por brancos,o time era um símbolo da dominação Afrikanner,tendo sua extinção defendida por muitos negros.Mandela tinha visão diferente.Ele acreditava que o rúgbi pudesse resgatar o sentimento patriótico nacional,além de promover a união dos dois lados étnicos do país.

Mesmo não conseguindo fugir do comum,o foco escolhido pela história já vale alguns pontos.Com um roteiro impecával,a narrativa possui ritmo fluído e a atenção do público é mantida até o fim. No quesito veracidade histórica,o filme está livre de absurdos ou furos nos momentos decisivos.Mostrando que o fato como realmente aconteceu está ali,e as filmagens originais da época não deixam mentir.Ou seja,"Invictus" serve para a sala de aula também.

Quem fica com o diícil posto do presidente sul-africano não poderia ser outro pessoa além de Morgan Freeman.E ele não decepciona,mas também não impressiona,o inglês tipicamente africano ele faz muito bem.Como capitão do time de rúgbi,Matt Damon faz um excelente trabalho,mostrando que vem melhorando a cada filme que faz.A fotografia de Tom Stern e a trilha sonora Kyle Eastwood são os elementos que consolidam Invictus como uma bem feita realização cinematográfica.

Apesar de ser o típico filme de Oscar,"Invictus" não conseguiu mais que duas indicações, uma para Morgan Freeman(chances razoáveis) e outra para Matt Damon(nenhuma chance) .Calcado de inteligência e certo conservadorismo,Invictus é um filme que tem a cara do diretor Clint Eastwood.Possui história e cinema bem delineados e surge como algo a mais,mas nada de novo.

nota:7,7

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

THE FANTASTIC MR.FOX
O FANTÁSTICO SR. RAPOSO(2009)
diretor:Wes Anderson
roteiro:Wes Anderson Noah Baumbach
elenco:George Clooney,Merl Streep,Bill Murray

Como convencer o público adulto a assistir uma animação também destinada a ele? Parece uma tarefa difícil,mas talvez o jeito mais fácil seja deixar o filme convencê-lo.É justamente isso que acontece com qualquer um que se depara com "O Fantástico Sr. Raposo",a animação convence,encanta e surpreende.O título e a temática parecem dignos de uma aventura destinada a crianças,com personagens e situações infantis,mas basta acompanharmos um tempo na vida do Raposo macho que tem como função sustentar a esposa e o filho e dar-lhes uma vida decente,para logo enxergarmos os traços humanos naquele animal silvestre vestido com terno e gravata.

Triste com a situação precária da família,Sr.Raposo decide mudar de vida comprando uma casa nova em uma grande e bonita árvore.Mesmo tendo um emprego fixo num jornal,ele é mal-remunerado,e Raposo se vê obrigado a retornar as suas raízes,saqueando as fazendas de três malvados fazendeiros da região.Ao tomarem conta do prejuízo,os humanos avançam contra os seres que vivem debaixo da terra com explosivos e escavadeiras,pondo em risco a vida de Sr.Raposo e sua família.

Qual outro cineasta faria isso se não Wes Anderson? A animação é seu sétimo filme e o primeiro nesse formato,e ainda assim,Mr.Fox não foge muito do estilo Anderson de filmar e ser.A primeira vista,suas obra não parecem nada além de 'estranhas'.E realmente são,por que é na capacidade de confundir e estranhar que Anderson busca a compreensão para os mais diversos conflitos humanos.Seus filmes são geralmente rotulados como comédias,devido a um humor bem peculiar que Anderson geralmente imprime nos seus dramas.Mr. Fox talvez seja o filme mais 'fácil' de ser dirigido de toda sua filmografia,as piadas são mais convencionais e o intuito de fazer uma animaçaõ 'para família toda' é claramente percebido

Esteticamente,Mr.Fox também possui a marca de Anderson.Os quadros estáticos e minimalistas marcam presença mais uma vez,embora agora sejam em formato stop-motion.Que é feito de forma artesanal e manual,uma dádiva em tempos onde os desenhos são todos computadorizados.Também chama atenção a fluidez dos movimentos,que normalmente ficam um pouco travados com uso dessa técnica.

Para dublar os bonecos,Anderson optou por rostos conhecidos mesclados com velhos colaboradores seus.George Clooney e Merl Streep são o casal de raposas.O grande Bill Murray aparece pela quinta vez em um filme do diretor,desta vez no papel de um hilário texugo.Jason Schwrtzman,Michael Gambon e Willian Dafoe completam o elenco.O filme conta também com uma inventiva trilha sonora de Alexandre Desplat,e a participação especial do vocalista da banda Pulp cantando uma divertida música non-sense.

Após conquistar uma legião de fãs de cinema independente,Wes Anderson busca o reconhecimento do grande público com Mr.Fox.E sendo ou não um sucesso,ele brinda o espectador com uma refinada animação,que reafirma seu estilo e reinventa o cinema stop-motion.A tragédia humana é representada pelas raposas de uma forma mais verossímil e interessante do que muitos dramalhões com atores reais.Um novo candidato a clássico cult.

nota:8,7

domingo, 31 de janeiro de 2010

SEDE DE SANGUE - BAKJWI(2009)
diretor:Chan-Wook Park
roteiro:Chan-Wook Park,Seo-Gyeong Jeong
elenco:Kang-Ho Song,Ok-Bin Kim


Sempre gostei de diretores que criam uma identidade dentro de seus filmes.Diretores que conseguem reinventar e ainda possuir uma marca forte.O coreano Chan-Wook Park criou a sua logo no seu primeiro filme,e continuou chamando os holofotes até 2003,quando lançou o aclamado,amado,odiado e detestado Oldboy.E estes mesmo adjetivos servem para ilustrar a reação do público com o resto de sua filmografia.Mas Park não pretende apenas ser controverso,sua visão lúdica e violenta do cinema é uma luz de originalidade e reinvenção no aparente marasmo do cinema mundial.Sede de Sangue,não poderia deixar de representar tudo isso.

A trama reinventa a fórmula clássica do vampirismo,de uma maneira irônica,surreal,erótica e mórbida.Tudo começa com um padre bom-samaritano que trabalha num asilo,onde convive diariamente com a morte e a dor.Cansado de sua rotina,o padre se torna cobaia de um experimento em busca da cura para um virús letal que assola uma longínqua comunidade.Nenhum dos 50 voluntários do estudo sobreviveu,e o mesmo parecia acontecer com o protagonista.Quando já é dado morto pelos médicos,ele misteriosamente ressuscita e começa a ser recebido como um santo por onde passa.Como tempo,o padre percebe que apesar de são,há algo diferente em si mesmo que o mantém vivo.O sangue.

Após o experimento,o protagonista é perseguido por uma desesperada mãe em busca da cura para a doença do filho.Convencido a acompanhar o doente,o padre acaba conhecendo uma frágil moça que todos dizem ser a esposa do enfermo,mas que na verdade é tratada por todos como uma escrava.Ignorando todos os preceitos de sua formação católica,o padre é envolvido pela misteriosa mulher.Queira me desculpar,mas é inevitável a comparação com Crepúsculo,insuportável febre adolescente da atualidade.Enquanto o casal dos livros de Stephanie Meyer contempla a castidade,o recato, e a pureza dos valores juvenis,os vampiros de Park invocam a sexualidade de maneira quase compulsiva.Os desejos mais lascivos do casal são despertados e postos para fora de maneira animalesca,assim como a sede de sangue.

A trama já é bastante atípica para considerarmos Sede de Sangue um filme diferenciado.Mas ainda não é o bastante para um diretor que adora ir pela contramão.As escolhas de Park nunca são as comuns,seja nos rumos do roteiro ou até no jeito de filmar.Ele raramente opta por enquadramentos simples e frontais,preferindo fazer a câmera 'viajar' pelo cenário,sempre ricamente composto.

Mesmo não sendo o seu melhor filme,Park consegue fazer algo totalmente diferente de trabalhos anteriores,mas sem perder suas características essenciais.E ainda com sua narrativa irregular,Sede de Sangue é um filme que seduz pela sua estética e trama inusitadas.Sangue novo e fresco para o cinema.

nota:8,5
PRECIOUS(2009)
diretor:Lee Daniels
roteiro:Geoffrey Fletcher
elenco:Gabourey Sidibi


Sensacionalista,maniqueísta e insuportável.Esses são um dos poucos adjetivos que cabem há uma certa senhora afro-americana que domina os televisores norte-americanos.E parece que agora,Oprah Winfrey chegou aos cinemas.Imagine aquele talk-show feito para donas-de-casa,insuportavelmente sensacionalista,mostrando no palco uma adolescente de 16 anos,obesa,analfabeta,grávida,pobre e aidética.Agora converta esse programa para um filme,e pronto,temos "Precious".

Tudo o que vemos na tela é uma excreto de imagens desfocadas mostrando a tragédia,somente ela e mais nada.Provoca repulsa a forma como a história desdobra um amontoado de infortúnios na vida de um bando de meras caricaturas de suburbanos nova-iorquinos,proferindo intermináveis diálogos no idioma "motherfucker".

Não digo que a trama é impossível,longe disso,a forma como o filme estabelece a fragilidade dos sistemas assistencialistas é perfeitamente crível.Só que isso é posto estrategicamente no filme como uma forma de acrescentar mais tragédia,mais sentimentalismo gratuito,mais uma forma de sugar as lágrimas daquela dona-de-casa que está na primeira fila do cinema por recomendação do último programa da Oprah.

Tecnicamente,Precious também surpreende.Lee Daniels,o diretor debutante,não faz mais nada além de lembrar o pior de Spike Lee.Não basta uma fotografia chique,ora desfocada ora escura,se o trabalho falha em (quase) todos os outros aspectos.Ainda há as atuações,que são competentes,mas que acabam sendo comprometidas pelo próprio texto.

Se este filme estivesse lá na fundo da prateleira da locadora,esquecido e coberto de poeira,eu até entenderia.Mas Precious tem sido um dos grandes destaques nos noticiários cinematográficos. Acumula 44 prêmios em festivais mundo afora,incluindo Globo de Ouro,Sundance e SAG´s.Além de 6 indicações ao Oscar desse ano,contando com melhor filme.Enfim,Precious vem sendo reconhecido como um exemplo de superação e luta,mas será que é um exemplo de bom cinema?

Antes de assistir,eu já estava com um pé atrás.Isso é um grande erro que cometemos,assistir o filme com preconceitos,devido ao cartaz,sinopse,alguma crítica negativa,ou até o trailer.Porem não vejo como eu poderia odiar um pouquinho menos Precious.Lenny Cravitz está nele!Ele tem umas músicas legais! Enfim,nada pode salvar um filme que está fadado a ser o que é desde sua idéia original.Nada salva um filme que nunca deveria ter existido.

nota:1,0

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Pequenas Críticas,Grandes Filmes(ou não) Parte 2

Katyn(2007)
dirigido por Andrej Wajda
escrito por Przemyslaw Nowakowski
estrelado por Artur Zmijewski

Pouco conheço do cinema polonês,e agora tenho meu primeiro contato com Andrej Wajda.Um senhor de 83 anos com uma extensa e premiada carreira,embora não seja tão celebrado quanto o seu conterrâneo responsável pela trilogia das cores,Kieslowski.Em Katyn,lançado agora em DvD no Brasil,o diretor mostra a eficiência e a mão firme desenvolvida em cinquenta anos de carreira.
Embora a trama seja ambientada na Segunda Guerra,o grande foco do filme é uma parte obscura e voluntariamente esquecida da história mundial:O massacre de estimadamente 20 mil oficiais poloneses na floresta de Katyn.O feito foi atribuído por muitos anos aos nazistas,e apenas com a queda de Stalin é que se comprovou que o assassinato foi ordenado pelos líderes da União Soviéica,que conseguiram obscurecer o fato através da manipulação da mídia.Não há quem não fique assustado com a selvageria e dissimulação dos líderes comunistas,e Wajda não perdoa ninguém,nem mesmo o espectador.
A trama é fora dos padrões,traçando um retrato de diversos familiares de vítimas do massacre,acompanhando a angústia de jovens viúvas e órfãs,a apreensão dos oficiais polacos antes do massacre,e o trabalho de manipulação do governo Soviético.
Tecnicamente impecável,Katyn apresenta uma reconstituição extremamente realista.Wajda não adapta o tragédia para torna-lá digerível ao público,e devido a isso,Katyn é um filme frio,de raso apelo emocional.O espectador não deve esperar um drama novelesco cheio de romance e reviravoltas inesperadas,o filme de Wajda é a realidade somente.
nota:8,0

Jornada Nas Estrelas V - A Última Fronteira(1989)
escrito e dirigido por Willian Shatner
estrelado por Willian Shatner,Leonard Nemoy

Star Trek em seu formato original,é uma série de televisão,mas não quer dizer que ela não funcione em outras mídias,afinal,Gene Roddenberry sempre pensou em criar um universo,não um mero "tv show" de boa audiência.A Última Fronteira,é a quinta jornada estrelar nos cinema,e até então sua mais desprezada e mal-sucedida.O quarto filme,que ficou sob o comando de Leo Nemoy(o Spock),fez um grande sucesso entre fãs e rendeu alto nas bilheterias.Os produtores decidiram deixar o quinto ao encargo do comandante Kirk,Willian Shatner,assim como seguiram suas mirabolantes idéias originais.
A Última Fronteira foi um filme problemático em sua concepção.O orçamento não cobria a grandiosidade das idéias de Shatner,os efeitos especiais falhavam constantemente e várias idéias originais tiveram de ser abandonadas no meio do caminho.Enfim,tudo conspirou contra o que seria o maior de todos os episódios cinematográficos da franquia.Porque se fizermos uma análise,as idéias do excêntrico Willian Shatner são excelentes,e com uma direção segura e alguns dólares a mais poderia se tornar mais uma obra-prima do universo Trekker.
A trama é interessante,e mostra o que seria a "essência sagrada" da série.Após um longo tempo de aposentadoria,a tripulação se reúne novamente numa forçada missão para chegar ao centro do universo,onde acredita-se estar Deus.
O clímax do filme é um tanto bizarro,a falta de uma produção melhor elaborada e um maior orçamento é visível.
Enfim,dá uma tristeza pensar no que poderia ser,vendo o que é.
nota:7,0

Atividade Paranormal(2007)
escrito e dirigido por Oran Peli
estrelado por Katie Featherson e Micah Sloat

Tenho uma natural aversão a filmes artificialmente caseiros,simplesmente por não serem filmes de verdade.Mas,desde que haja originalidade e entretenimento juntos,o resultado pode até ser agradável,como o espanhol [REC].Em Atividade Paranormal,não há um mínimo rastro de inovação,mas com competência e muita sorte,Oran Peli conseguiu divulgar seu filmeco e distribuí-lo pelo mundo.
As vezes é difícil imaginar que uma idéia na sua centésima reciclagem,ainda cause tanto medo e e faça sucesso entre o grande público.Um casal acredita que esta sendo amaldiçoado por espíritos,e então resolve filmar seu sono nada tranquilo.Aí começa o esperado.Uma porta se abre sozinha,uma voz infantil chama o casal pelo nome,ele contratam um "demonologista"(?) e no fim... e no fim...
Não há absolutamente nada para comentar sobre nenhum aspecto do filme.Apenas os últimos divertidos cinco minutos,que fecham o filme com um certo impacto.Até lá,tudo o que Oran Peli faz é encher linguiça.Uma enrolação extremamente chata,mostrando o dia-a-dia do casal finado(ops,falei).
Atividade Paranormal custou 15 mil dólares e rendeu 104 milhões só no U.S.A. É ,acho que ta na hora de levantar meu bundão da cadeira,arrumar uma câmera e fazer um filme de terror.
nota:4,0

Ta Rindo de Quê?(2009)
escrito e dirigido por Judd Apatow
estrelado por Adam Sandler e Seth Rogen
Judd Apatow praticamente domina a indústria da boa comédia,claro que devemos excluir todos os filmes dos irmãos Wayans e aquelas paródias podreiras que ainda chamam muita gente para os cinemas.Apatow não só se tornou um diretor reconhecido,como também pode ser visto como um "caça-talentos",ou seja,ele é um grande produtor do ramo.É ele o cara por trás de pérolas como Superbad,O Virgem de 40 Anos e Ligeiramente Grávidos.Em Funny People,chamado aqui no Brasil de "Ta Rindo do Quê?",Apatow mais uma vez chama seus atores favoritos(Seth Rogen,Leslie Mann,Jonah Hill,entre outros),mais o sumido Adam Sandler e faz um filme mais sério,sem deixar de ser uma comédia,mas com um toque dramático e autoral.
Os primeiros 90 minutos são excelentes,ou seja,é o mesmo Apatow de antes.A dramaticidade é bem dosada,assim como as esdrúxulas e deliciosas piadas com "dick's","pussy's" e "motherfucker´s".Adam Sandler entra em cena ótimo,mostrando aquele ator de dramas que não víamos desde "Punch-Drunk Love".Seth Rogen contracena mais uma vez com a sua versão gorda,Jonah Hill,além de outras inusitadas participações especiais.
A trama conta os últimos dias de um famoso comediante decadente,George Simmons,após ele ser diagnosticado com leucemia.Para continuar sua carreira fazendo comédia stand-up,Simmons conta com a ajuda de um comediante pobre,que vive numa comunidades de pessoas do mesmo ramo.Se o filme acabasse no fim desses 90 minutos,com certeza teríamos mais uma clássico de Apatow.
Mas,infelizmente,o diretor ainda nos reserva mais sofríveis 30 minutos,em que ele transforma o drama cômico do começo num romance água com açúcar.As piadas acabam,o ritmo cai e os bocejos começam.Enfim,Apatow mostra que poderia muito bem chamar Kevin Smith ou qualquer outro diretor de comédias mais experiente que o resultado seria muito melhor.
Mais uma vez,dá uma tristeza pensar no que poderia ser vendo o que é.
nota:6,0