domingo, 11 de outubro de 2009

ANTICHRIST - ANTICRISTO
diretor:Lars Von Trier
roteiro:Lars Von Trier
elenco:Charlotte Gansbourg,Willian Dafoe

Assim como uma grife de moda estampa sua marca em todos os modelos de sua franquia,Trier faz questão de por seu nome em evidência.O primeiro frame de seu novo trabalho é ,o seu nome em letras grandes e garrafais:¨LARS VON TRIER¨.Com carreira e arrogância já consolidadas no cinema mundial,ele lança sua mais controversa e importante obra."Anticristo" é um filme lírico,repleto de significados nas entrelinhas,recheado de violência gráfica repulsiva,e restrito da um público ínfimo que irá apreciar a obra.Já da pra perceber que é mais um "filme de autor"."Anticristo" não é suspense,não é drama familiar,não é pornô,muito menos terror,"Anticristo" é um filme de Lars Von Trier.

Foi Trier um dos idealizadores do movimento cinematográfico "Dogma 95".Uma série de regras seguidas por um grupo de cineastas europeus na década de 90.O movimento proibia trilha sonora,créditos,luz ou som artificial e cenografia.O objetivo resgatar o que seria o cinema na sua mais pura forma,um forma de protesto contra o uso do cinema como exploração comercial."Anticristo" quebra totalmente os tais "dogmas".O novo filme de Trier é uma experiência de cinema completa e poderosa.Música marcante,fotografia estonteante,câmera voyeurística,créditos grandes e coloridos.Isso sim é cinema na sua mais pura forma!

sinopse:Um casal acaba de perder seu filho de dois anos.Ele(Willian Dafoe) é um terapeuta que torna todas as pessoas ao seu redor seus pacientes.Ela(Charlotte Gansbourg) é uma historiadora que acaba se submetendo a um "luto anormal" após a perda do primogênito.Numa tentativa de acabar com o sofrimento da mulher,Ele leva ela até uma cabana numa floresta distante chamada "Éden”,local onde o "caos reina" .

Certa vez,Kurosawa disse que a primeira cena nunca deve ser a mais elaborada.É difícil pensar em algo do tipo,mas "Anticristo" é um filme que vale pelos minutos iniciais.Trier começa sua história com uma criativa e ousada sequência slow motion em preto e branco.A cena mostra o grande mote do filme:Enquanto o casal transa loucamente no banheiro,o bebê abre a trava do berço,sobe no balcão e se joga pela janela. Trier mira cada detalhe da cena,o pênis penetrando na vagina,um vaso espatifando no chão,o bebê caindo lentamente junto com a neve...Tudo isso embalado por um coral de sopranos cantando suavemente... As reticências servem pra você imaginar a cena em sua cabeça,mas algo assim,francamente, só a mente de Lars Von Trier pode imaginar.

Lançado em esse ano em Cannes,o filme,como se fosse novidade,dividiu a platéia.Ouve uma vitória parcial do time dos que vaiaram,mas os aplausos sem dúvida existiram.A principal crítica do povo que não gostou é a de que o Trier não diz nada.Segundo eles,toda a violência e o sexo do filme são gratuitos,apenas mais um fetiche do diretor obcecado por polêmica.Muito pelo contrário,"Anticristo" tem muito a dizer.

Talvez um defeito do filme seja ele dizer coisas demais.É grande o número de significados,de mensagens e de simbolismos na obra.É apenas uma questão de tempo para que cinéfilos lunáticos comecem a decifrar os enigmas de Trier. O primeiro significado é bem simples."Anticristo" é um manifesto feminista.Uma reflexão sobre a soberania do homem na relação de um casal e o papel da mulher através da história.O filme mostra o anormal luto e comportamento da personagem de Gansbourg como uma forma de revolta contra o papel da fêmea na natureza.Uma reflexão sobre a intransigência do sexo masculino e a eterna representação da mulher como ser sentimental com a única função de reprodução.O fato da floresta se chamar "éden" é uma clara alusão ao jardim da criação,o início da tradição repressora masculina.Ainda no final,a belíssima última cena também confirma a tese.

Anticristo seria um filme muito mais celebrado se Trier fosse mais benevolente com a platéia.Ele simplesmente não perdoa.É como se ele passasse a platéia por uma espécie de processo seletivo,um joguinho para ver quem fica até o fim sessão.É um filme difícil para qualquer espectador,mas é especialmente devastador para as mulheres,principalmente pelas cenas sado-masoquistas com Charlotte Gansbourg.Só na metade da duração,o público tem a infelicidade de conferir a primeira cena de mutilação genital em close do cinema.E o pior é que ela nada acrescenta a trama,que poderia muito bem terminar com menos sangue.

Se o senso artístico de Trier esta a todo vapor,o elenco também está no auge de seu talento.A trama possui apenas dois personagens,interpretados por uma dupla de atores geniais e subversivos,Willian Dafoe e Charlotte Gansbourg.Willian Dafoe já havia passado por uma situação parecida nos anos oitenta,quando protagonizou "A Ultima Tentação de Cristo" de Scorcese,um dos filmes mais polêmicos daquela década.A atriz francesa,Charlotte Gansbourg,se entrega totalmente a sua personagem,incorporando as cenas de dor e sofrimento de maneira impressionante.Mas uma vez se pode perceber a mão do diretor,sempre competente na direção de atores.

Mesmo com sua arrogância e orgulho,Trier admite suas influências.Logo na abertura dos créditos finais ele dedica o filme a Andrei Tarkovsky,falecido diretor soviético que influencia "Anticristo" da cabeça aos pés.Coincidentemente há um més atrás escrevi sobre "Sacrifício",aparentemente a maior espelho de Trier para filmar sua obra.O lirismo,a influência bíblica e o slow motion em preto e branco também são características do filme de Tarkovsky.

Tecnicamente perfeito,escrito e filmado de forma única,"Anticristo" é um filme diferenciado.Talvez um pouco depressivo e sangrento demais,mas isso são apenas ingredientes que fazem da obra uma experiência forte e inesquecível,cinema com C maiúsculo.

nota:8,0

CAOS REINA
Momento "Que Porra é Essa?!" do filme: