quarta-feira, 9 de setembro de 2009

CIDADE DE DEUS(2002)
diretor:Fernando Meireles,Kátia Lund
roteiro:Bráulio Mantovani
elenco:Alexandre Rodrigues,Jõao Firmino,Matheus Nachtergaele

Há 44 anos atrás,Glauber Rocha criou a tal da "estética da fome".Um olhar cinematográfico especial para retratar a miséria do povo brasileiro.Nos seus filmes,Glauber mostrava sua visão mísera sobre a miséria do sertão nordestino.Desenvolvendo suas tramas em ritmo lento e com atuações teatrais,o baiano promoveu a inclusão da cultura brasileira nos filmes nacionais.Ninguém imaginava,que 37 anos depois a pobreza do povo brasileiro no cinema mudaria tanto.Era difícil prever a mudança que os filmes lançados nessas três décadas provocariam na visão dos cineastas brasileiros."Cidade de Deus",é,na sua estrutura narrativa,o extremo oposto dos filmes de Glauber.E,assim como os filmes do baiano,a obra de Fernando Meireles é um divisor de águas do cinema nacional do século XXI.Um drama envolvente,tecnicamente perfeito,que assim como possui influências claras,é também um poço inovação e originalidade.

"Cidade do Deus" envolveu alguns dos melhores profissionais de cinema brasileiros da atualidade.Todos reunidos para falar de um dos temas mais contundentes da produção cinematográfica nacional,a violência urbana.Na verdade,o tema não era tão contundente assim até lançamento do filme,em 2002.A obra gerou inúmeros debates,revelou novos talentos,ganhou prêmios mundo afora,e abriu caminho para vários outros filmes sobre a violência brasileira que viriam pela frente.E se já não bastasse a babação da crítica internacional em cima da obra"Cidade de Deus" tornou-se um dos filmes brasileiros mais populares de todos os tempos,a a violência nua e crua que chocou as platéias estrangeiras,divertiu o público brasileiro,que já adotou a famosa fala:"Dadinho é o c@!#$....." como um bordão popular.Portanto,já não serei o primeiro a ovacionar a obra-prima de Meireles,muito menos o último.

Diferente de Glauber,Fernando Meireles não possui nenhuma estilo próprio,ele procura reinventar-se a cada projeto.Isso mostra sua já assumida preferência em aproximar suas obras do público ao invés da crítica.É impossível defini-lo como um estilo,e sim com suas preferências e preocupações ao realizar um filme.Basta ter em mente que ele é um diretor que possui na sua filmografia um filme infantil "Menino Maluquinho 2" junto com o próprio "Cidade de Deus".Mas,além de tudo,ele é um grande orgulho para todos os cinéfilos brasileiros,que há tempos não tinham um conterrâneo alcançando voôs tão altos.Indicado ao Oscar,e diretor de outros dois excelentes filmes em Hollywood,"Jardineiro Fiel" e "Ensaio Sobre a Cegueira".

sinopse:Buscapé é um menino pobre,habitante da recém-inaugurada comunidade "Cidade de Deus".Com o tempo,a violência toma conta o local,que acaba se tornando uma das mais violentas favelas do Rio de Janeiro.Sensível e desorientado,Buscapé teme a vida de bandido,e busca na fotografia uma salvação.Pelas lentes da sua câmera,ele olha conta a história da favela e seus mais ilustres personagens.

O filme traça um interessante panorama do Rio de Janeiro dos anos 60,70 e 80.Reconstituindo com perfeição o período em nos bailes funk´s se escutava James Brow ao invés de Tati Quebra-Barraco.Todos os elementos culturais pertencentes a cada década estão presentes no filme,que são retratadas de forma linear,em três fases nitidamente distintas entre si.Mesmo assim,o ritmo nunca se perde,e até mesmo o interesse do público que não liga pra esses detalhes é mantido.

As principais críticas ao filme do povo que não gostou são:
1.Cidade de Deus glorifica a violência.
2.O filme passa uma imagem ruim do Brasil para o público estrangeiro.
Não considero o filme perfeito,impecável,mas não consigo compreender as duas afirmações.A primeira é a mais absurda."Cidade de Deus" é um dos mais bonitos manifestos pró-paz já feitos no cinema.Diferente do 'neo-noir tarantinesco' no qual o filme é muitas vezes erroneamente comparado,é explícito em cada cena de violência a discrição no qual Meireles e sua equipe tratam o tema.Sempre quando alguém morre,a imagem é imediatamente desfocada,e a câmera muda de perspectiva.A violência gráfica é pouca durante todo o filme,assim como qualquer apologia a ela.Isso sem falar no nítido moralismo do desfecho da trama.
Quanto a segunda questão,basicamente deve-se ressaltar que é um comentário feito pessoas que não compreendem cinema,ou não tem noção dos problemas do país onde vivem.O que eles queriam ver na tela num filme sobre o Brasil? Mulatas sambando no carnaval? As praias e todas maravilhas naturais do país? Será que todo filme nacional tem que ser uma propaganda turística?

Como já citei antes,"Cidade de Deus" é constantemente comparado a "Pulp Fiction" e outros filmes de Tarantino.Tal comparação não condiz em nada com o propósito dos realizadores,que negam veemente qualquer ligação.Mesmo assim,existem claras influências do cinema dos anos 90.É fácil de enxergar "Os Bons Companheiros" no filme.O ritmo frenético,a edição inteligente e principalmente a narração em off,se assemelham muito com a obra de Scorcese,que por sinal é fã de Meireles.Em algumas cenas a influência pode até ser vista como uma homenagem.Sabe aquela tomada de "Os Bons Companheiros" em que a câmera viaja pelo bar e Ray Liotta vai apresentando as curiosas figuras do local ao espectador? Troque o bar pela favela,Ray Liotta por Alexandre Rodrigues e os mafiosos italianos por bandidos dos morros cariocas,pronto,você tem uma cena de "Cidade de Deus".

Se pudesse estimar uma porcentagem de méritos dos realizadores do filme,atribuiria uns 40% do brilhantismo da obra a Daniel Rezende,o responsável pela edição.Sua influência na forma como a trama se desenvolve e nos truques de câmera é enorme.Talvez a edição seja um dos maiores diferenciais da obra,mas está milhas longe de ser o único.Deve-se aplaudir Bráulio Mantovani pelo roteiro perfeito,César Charlone pela fotografia vívida que muda conforme a trama,o elenco impecável,e é claro,aplausos também para Fernando Meireles,o maestro dessa tão bem orquestrada obra-prima.

nota:9,6

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