sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

THE HURT LOCKER - GUERRA AO TERROR(2008)
diretor:Kathryn Bigelow
roteiro:Mark Boal
elenco:Jeremy Renner,Anthoni Mackie


Não é fácil definir a guerra em um filme.Por isso,cada obra do gênero possui seu olhar sobre o conflito armado que retrata.Recentemente,o mestre Eastwood inovou ao contar os dois lados de uma mesma guerra partindo do ângulo de seus soldados(Cartas de Iwo Jima e Conquista da Honra).Spielberg e Oliver Stone gostam de transformar a guerra num espetáculo pirotécnico,onde é ressaltado o brio e a glória dos combatentes.(O Resgate do Soldado Ryan,Platoon).Kubrick gostava de mostrar os soldados aprisionados pelo quartel,traçando secos retratos sobre a vida nos campos de batalha(Nascido Para Matar,Glória Feita de Sangue).Já o indiscutível maior filme de guerra de todos os tempos,Apocalipse Now de Coppola,noticiava a presença de um inimigo invisível nos fronts,a loucura,"The madness". O combate armado é visto como um vício forte e letal,uma droga.Assim como é dito nos segundos iniciais de "Guerra Ao Terror",filme dirigido por Kathryn Bigelow com nove indicações ao Oscar e a certeza de que entrara para história.

Existem poucas obras dignas de menção sobre a guerra do Iraque.Alguns diretores famosos já se aventuraram no tema,ás vezes bem-sucedidos,como Ridley Scott em "Rede de Mentiras",outras vezes extremamente infelizes,como DePalma no amador "Redacted".Porém nenhum filme havia sagrado-se definitivo,e a guerra do Iraque ainda não tinha seu representante ideal no cinema.O motivo talvez fosse o receio de alguns em falar sobre um assunto ainda tão fresco,que ainda mancha a bandeira americana.Ninguém esperava que uma obra independente,sem ambições de mercado e dirigido por uma mulher,viria a ser o retrato final e definitivo da guerra no Iraque.

A trama segue os últimos dias de recrutamento de um esquadrão especializado em desarmar bombas nos campos inimigos.O foco se mantém sobre três soldados de características e objetivos distintos.Owen,Sanborn e James.Apesar de sua experiência,James é novo na equipe.Chamado para substituir um veterano recém-morto em atividade,ele causa desconfiança no grupo,apesar de sua inegável competência.São retratadas a convivência e as arriscadas missões do esquadrão,que em breve terão seu tão esperado descanso.Esperado para alguns,aqueles que não estão absortos pelo vício da guerra.

Assim como Coppola e Kubrick,Guerra ao Terror valoriza os aspectos psicológicos dos soldados.Os conflitos da trama são movidos pelos temperamentos adversos dos recrutas,que acabam sendo obrigados a encontrar a amizade num campo de batalha.Um dos mais belos questionamentos feitos no filme é: Como pessoas que se odeiam podem lutar pela mesma bandeira? A sensação de alienamento dos recrutas é retratada com igual sensibilidade,mostrando os soldados como jovens que simplesmente não sabem ao certo porque estão ali.Para aqueles que buscam tiroteio e explosões desenfreadas,se surpreenderão com os momentos tocantes e o constante uso de silêncios nas cenas.

Guerra ao Terror também não deixa de lado a as sequências de ação cativantes,com esplosões e bons efeitos especiais.Quando os recrutas se veêm em situações de vida ou morte,a tensão é elevada a quinta potência,e as cenas tornam a distração uma tarefa quase impossível.E mesmo com as explosões e tiroteios presentes,cada uma delas vem com uma razão,um motivo dramatúrgico,não apenas pirotecnia para enfeite.

Como é de praxe em todo filme que dá atenção maior aos aspectos psicológicos,as atuações são de uma importância crucial.E também nesse aspecto,Guerra Ao Terror surpreende,contando com um elenco que mescla protagonistas anônimos com coadjuvantes famosos.O principa destaque é Jeremy Renner,que aflora toda a arrogância e desobediência de seu personagem,James. Guy Pearce e Ralph Fiennes são os mais famosos,e ambos ironicamente duram não mais do que dez minutos vivos.

Antes,se perguntassem quem era Kathryn Bigelow,muitos diriam que ele era a ex-mulher de James Cameron,hoje ela se tornou a diretora de "Guerra Ao Terror".A senhora de 59 anos assume o filme com uma autoridade invejável,imprimindo um jeito de filmar e conduzir o filme diferenciado.Isso sem falar na experiência corajosa de rodar uma película independente em terras estrangeiras.Embora ainda tenha o ex-marido pela frente,Bigelow possui boas chances de ser a primeira mulher a ganhar um Oscar de melhor direção.

Um sopro de criatividade no cinema independente americano,o filme marca para sempre o cinema e o espectador.Guerra Ao Terror é o cinema e a guerra em suas formas mais puras e cruéis

nota:9,3

domingo, 21 de fevereiro de 2010

A SERIOUS MAN - UM HOMEM SÉRIO(2009)
direção e roteiro:Joel e Ethan Coen
elenco:Michael Stuhlbarg,Richard Kind,Fred Melamed

Até quando um homem pode suportar os infortúnios da vida de maneira centrada e correta? A partir de que ponto ele deixará de ser "Um Homem Sério"? Estas já são perguntas frequentes na filmografia dos irmãos Coen,não apenas no seu novo trabalho,cujo irônico título parece sintetizar tudo o que eles fizeram antes.Forçando ao máximo a paciência de seu protagonista,pregando peças no espectador a todo momento,ironizando a ilusão da família feliz,"Um Homem Sério" é a mais pura essência de Joel e Ethan Coen.

Desde as primeiras civilizações,dentro de uma família,a figura mais importante é o patriarca.Soberano nas decisões da casa,o pai comanda os rumos de seus consanguíneos.Larry Gopnik é um professor de física,casado e pai de dois filhos,vivendo na classe média dos anos 70.Contrariando o que se espera de sua posição,Gopnik vive como um mero coadjuvante na vida de sua família.Sua mulher o despacha de casa para casar com um viúvo sessentão que insiste num "divórcio ritualístico".E os infortúnios da vida parecem não ter mais fim.E quando nosso herói parece estar a beira da explosão,ele prefere buscar ajuda na religião que fundamenta sua família,o judaísmo.Ele está aprisionado pela sua passibilidade,é apenas um homem dócil totalmente incapaz de agir.E assim,indo ao encontro de rabinos e advogados,Gopnik se prepara para um futuro obscuro e incerto.

Larry é o retrato do que seria um homem perfeito para a sociedade.Incapaz de reagir a qualquer situação,conformando-se em ter um emprego estável e uma família "feliz",mesmo que todos vivam em total desarmonia e discórdia entre si.É o tipo de personagem preferido dos irmãos Coen,que fazem de "Um Homem Sério" seu filme mais autoral.Joel e Ethan cresceram nos anos 70,num subúrbio em Minneapolis,filhos de mãe e pai judeus.Desfrutando de certa liberdade criativa,os diretores ironizam os valores religiosos os quais foram submetidos na adolescência,fundindo o dogmatismo com toda a imoralidade e liberdade dos 70.E é aí que nasce uma das melhores cenas do filme,quando o filho de Gopnik atravessa o dia de seu "bar mitzvah" sob o efeito de alguns cigarrinhos de maconha,divididos secretamente com seu amigo de escola.

Uma das críticas mais frequentes vinda do público sobre os filmes dos Coen,é a resistências dos dois em aceitar apenas um gênero.Uma comédia dos irmãos,nunca é um filme para você cair da cadeira,pois além da fuga do humor fácil e burro,o drama e a reflexão são sempre acionados,por mais cômicas que as tramas pareçam ser."Um Homem Sério'' não quer mesmo ser levado sério a todo momento. Um exemplo é a incompreensível abertura do filme.Mudando o formado da tela, é contada uma bizarra história de terror,sobre um falecido que visita uma família judia na era medieval.Logo após a parábola,os créditos e a música sugerem que veremos pela frente um filme de suspense sobre fantasmas judeus e antigas maldições,mas logo entra em cena o filme descrito na sinopse.

Tecnicamente irrepreensível,"Um Homem Sério" conta com excelentes atuações.A começar pelo protagonista,Michael Stulhbarg que representa a fragilidade e passividade em pessoa.Por motivos não conhecidos,Stulhbarg não foi indicado ao Oscar deste ano.A fotografia elegante é feita pelo veterano Roger Deakins,antigo colaborador dos Coen,e já indicado a 8 Oscar pelo seus brilhantes trabalhos.A trilha sonora é composta por um fina seleção de hits dos anos 70,que inclui a fantástica e esquecida banda Jefferson Airplane.

Para a surpresa de muitos,"Um Homem Sério" figura entre os dez indicados a melhor filme no Oscar 2010.Muitos podem considerar que só o nome dos irmãos na direção pôs "Um Homem Sério" na lista de indicados.Ledo engano.O filme é a reunião dos elementos essenciais do cinema dos diretores:humor negro,final aberto,personagens peculiares... Um híbrido entre o drama sólido de "Fargo" e a comédia obscura de "Queime Depois de Ler".Por tudo isso e mais um pouco,é uma grande felicidade ver "Um Homem Sério" na lista de indicados,mesmo que as chances de ver o filme levar o prêmio sejam zero.

Para muitos,pode até parecer exagero,mas acredito que "Um Homem Sério" tem todo o direito de figurar entre as cinco melhores realizações de Joel e Ethan Coen.Autoral,ousado,criativo,engraçado,comovente e acima de tudo,sincero.Uma obra candidata a cravar sua bandeira no restrito território de filmes cults,que chamam a atenção não por outra coisa a não ser por serem únicos.Aceite o mistério.

nota:9,0

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

INVICTUS(2009)
diretor:Clint Eastwood
roteiro:Anthony Peckham
elenco:Morgam Freeman,Matt Damon


Mais uma vez,Clint Eastwood! Com seus já avançados setenta anos de idade continua sendo um dos diretores mais 'trabalhadores' do cinema atual.Agora,será que os filmes que o velhinho lança quase que anualmente são realmente bons? Com "Gran Torino", Eastwood relembrou seus diais de Dirty Harry num marcante drama sobre racismo,em seu lançamento mais recente,ele investe mais uma vez no tema,agora em proporções globais."Invictus" conta a chegada de Nelson Mandela no poder da África do Sul,o fim do apartheid e o renascimento de um time de rugbi.

É difícil fazer um filme sobre Nelson Mandela e fugir de alguns clichês pentelhos,como discursos sobre paz e igualdade,personagens caricatos e toda a pompa dos filmes do tema.A versão diretor de Eastwood,aquela que passa milhas distante da sua versão ator,gosta de cinema sério,visando temas sociais bastante discutidos em congressos pela paz mundial.Invictus não foge de nada disso,mas as diversas qualidade técnicas e a competência de Eastwood acabam por contornar o cansaço da fórmula.

"Invictus" foca o período inicial da presidência do carismático líder negro,quando o país passava por tempos difíceis(passa até hoje) e toda população esperava de medidas imediatas para o combate aos emergentes problemas sociais do país.Mesmo arriscando sua popularidade,o presidente optou por incentivar e investir o principal time de rugbi da África do Sul,o Springboks,que em breve disputaria a copa do mundo.Além de ser um esporte jogado quase que unicamente por brancos,o time era um símbolo da dominação Afrikanner,tendo sua extinção defendida por muitos negros.Mandela tinha visão diferente.Ele acreditava que o rúgbi pudesse resgatar o sentimento patriótico nacional,além de promover a união dos dois lados étnicos do país.

Mesmo não conseguindo fugir do comum,o foco escolhido pela história já vale alguns pontos.Com um roteiro impecával,a narrativa possui ritmo fluído e a atenção do público é mantida até o fim. No quesito veracidade histórica,o filme está livre de absurdos ou furos nos momentos decisivos.Mostrando que o fato como realmente aconteceu está ali,e as filmagens originais da época não deixam mentir.Ou seja,"Invictus" serve para a sala de aula também.

Quem fica com o diícil posto do presidente sul-africano não poderia ser outro pessoa além de Morgan Freeman.E ele não decepciona,mas também não impressiona,o inglês tipicamente africano ele faz muito bem.Como capitão do time de rúgbi,Matt Damon faz um excelente trabalho,mostrando que vem melhorando a cada filme que faz.A fotografia de Tom Stern e a trilha sonora Kyle Eastwood são os elementos que consolidam Invictus como uma bem feita realização cinematográfica.

Apesar de ser o típico filme de Oscar,"Invictus" não conseguiu mais que duas indicações, uma para Morgan Freeman(chances razoáveis) e outra para Matt Damon(nenhuma chance) .Calcado de inteligência e certo conservadorismo,Invictus é um filme que tem a cara do diretor Clint Eastwood.Possui história e cinema bem delineados e surge como algo a mais,mas nada de novo.

nota:7,7

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

THE FANTASTIC MR.FOX
O FANTÁSTICO SR. RAPOSO(2009)
diretor:Wes Anderson
roteiro:Wes Anderson Noah Baumbach
elenco:George Clooney,Merl Streep,Bill Murray

Como convencer o público adulto a assistir uma animação também destinada a ele? Parece uma tarefa difícil,mas talvez o jeito mais fácil seja deixar o filme convencê-lo.É justamente isso que acontece com qualquer um que se depara com "O Fantástico Sr. Raposo",a animação convence,encanta e surpreende.O título e a temática parecem dignos de uma aventura destinada a crianças,com personagens e situações infantis,mas basta acompanharmos um tempo na vida do Raposo macho que tem como função sustentar a esposa e o filho e dar-lhes uma vida decente,para logo enxergarmos os traços humanos naquele animal silvestre vestido com terno e gravata.

Triste com a situação precária da família,Sr.Raposo decide mudar de vida comprando uma casa nova em uma grande e bonita árvore.Mesmo tendo um emprego fixo num jornal,ele é mal-remunerado,e Raposo se vê obrigado a retornar as suas raízes,saqueando as fazendas de três malvados fazendeiros da região.Ao tomarem conta do prejuízo,os humanos avançam contra os seres que vivem debaixo da terra com explosivos e escavadeiras,pondo em risco a vida de Sr.Raposo e sua família.

Qual outro cineasta faria isso se não Wes Anderson? A animação é seu sétimo filme e o primeiro nesse formato,e ainda assim,Mr.Fox não foge muito do estilo Anderson de filmar e ser.A primeira vista,suas obra não parecem nada além de 'estranhas'.E realmente são,por que é na capacidade de confundir e estranhar que Anderson busca a compreensão para os mais diversos conflitos humanos.Seus filmes são geralmente rotulados como comédias,devido a um humor bem peculiar que Anderson geralmente imprime nos seus dramas.Mr. Fox talvez seja o filme mais 'fácil' de ser dirigido de toda sua filmografia,as piadas são mais convencionais e o intuito de fazer uma animaçaõ 'para família toda' é claramente percebido

Esteticamente,Mr.Fox também possui a marca de Anderson.Os quadros estáticos e minimalistas marcam presença mais uma vez,embora agora sejam em formato stop-motion.Que é feito de forma artesanal e manual,uma dádiva em tempos onde os desenhos são todos computadorizados.Também chama atenção a fluidez dos movimentos,que normalmente ficam um pouco travados com uso dessa técnica.

Para dublar os bonecos,Anderson optou por rostos conhecidos mesclados com velhos colaboradores seus.George Clooney e Merl Streep são o casal de raposas.O grande Bill Murray aparece pela quinta vez em um filme do diretor,desta vez no papel de um hilário texugo.Jason Schwrtzman,Michael Gambon e Willian Dafoe completam o elenco.O filme conta também com uma inventiva trilha sonora de Alexandre Desplat,e a participação especial do vocalista da banda Pulp cantando uma divertida música non-sense.

Após conquistar uma legião de fãs de cinema independente,Wes Anderson busca o reconhecimento do grande público com Mr.Fox.E sendo ou não um sucesso,ele brinda o espectador com uma refinada animação,que reafirma seu estilo e reinventa o cinema stop-motion.A tragédia humana é representada pelas raposas de uma forma mais verossímil e interessante do que muitos dramalhões com atores reais.Um novo candidato a clássico cult.

nota:8,7